José da Silva
é um brasileiro como tantos outros, honesto, trabalhador, defensor da família,
dos bons costumes, devoto de Nossa Senhora Aparecida, chegou à classe C depois
de políticas de incentivo ao consumo, orquestrada por um governo que diziam ser
de esquerda, defensor dos trabalhadores, mas que enriqueceu banqueiros, latifundiários
e empreiteiros, e decaiu para a classe D após a maré alta baixar e o preço
pelas equivocadas políticas de isenção fiscal de determinados setores amigos
não poderem mais ser mantidas.
José da Silva
está puto com o mundo, com a bandidagem, com a roubalheira. Protesta nas redes
sociais, brigou com amigos, não vê mais o primo, está emburrado com o irmão.
Participou de várias passeatas com sua camisa da seleção canarinho, que comprou
no camelô. Gritou, bradou, urrou. Foi à luta.
Na pauta
diversificada, lutou contra tudo, defendeu a revogação da lei do desarmamento
com unhas e dentes. Defensor da família e dos bons costumes queria ter o
direito de empunhar uma arma contra bandidos que quisessem o mal dos seus.
Lutou, bradou, urrou. Foi à luta.
E ficou feliz
quando, finalmente, a famigerada lei caiu, liberando os cidadãos de bem a
possuir uma arma de fogo para sua defesa e de sua família. Estava em êxtase,
simplesmente em êxtase.
Assim que as
regras passaram a valer, dirigiu-se senhor de si, altivo, radiane, peito
estufado para uma loja, a fim de adquirir a sua proteção familiar. Desceu do
segundo ônibus quatro quadras da loja que escolhera. Foi revistado na entrada,
questionado. Ao adentrar, perquiriu o vendedor sobre a aquisição desejada. Foi
murchando: curso de mil reais, a arma, a mais simples, dois mil e oitocentos
dinheiros. José da Silva ganhava salário mínimo.
Mas, ele era
um cidadão de bem, haviam dito que ele era merecedor de defender os seus, que
ele não poderia contar com ninguém. Sem pestanejar, José da Silva, o cidadão, o
pai de família, comprou o curso, a arma, parcelando em 4 vezes. Quatro meses de
salário.
Morreu de
fome. A mulher e os filhos os tinham deixado. Mas morreu sem ser roubado.
Possuidor do instrumento que lhe dava segurança.
31 de maio de
2017
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