segunda-feira, 2 de setembro de 2019

Eles morreram

Eles morreram. Eu não. Eis os seus corpos estirados no chão, cravados de balas, o sangue escorrendo nas valas. Eles se foram. Eu não.

Eles morreram. Eu não. Os mesmos pecados. Os mesmos vizinhos. Os mesmos horários. Eles se foram. Eu não.

Eles morreram. Eles não faziam nada. Eles apenas aproveitavam. Eles apenas estavam. Eles morreram. Eu não.

Eles morreram. Eu não. Eles eram inocentes. Eles não negaram leis. Eles as seguiam. Eles sorriam. Eles viviam suas vidas miseráveis. Eu não.

Eu quis transcender. Eu quis ser mais do que me permitiam ser, de onde nasci. Eu queria superar as expectativas. Lucrar, ser alguém aos olhos deles de lá. E eu fui. Mas eu não morri.

Morreram eles. Inocentes. Que não ousaram negar o que eu ordenava. E não podiam negar o que mandavam. Eles morreram. Eu não.

Eu continuo pagando a proteção, que sigo dizendo divina, a quem deveria proteger eles de mim. E estes recebem de bom grado a boquinha gorda que das minhas mãos sujas saem.

Eles morreram e morrerão.

Eu continuarei vivo nas páginas de procurados. Até que alguém pague mais alto abono que eu.

Eis o tempo de vida que me resta.