quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

Adeus ano velho

Isso mesmo, continuem, continuem aí dizendo que o ano velho se foi, que o novo se vem.

Continuem se enganando que o ano que vem será melhor. Que tudo irá se realizar no ano que vai nascer.

Não há ano que nasce. Não há ano que morre.

É só mais um dia que se foi.

E outro que vem para continuarmos repetindo os mesmos erros de sempre,

até que o ano se acabe.

29 de novembro de 2017

segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

Natal

- Esse ano não vai ter Natal.

Foi o que decretou o pai desempregado aos três filhos pequenos e à mulher, incapacitado que estava de bancar os caprichos de uma data inventada para o comércio, para o consumo e nada mais.

- A gente já se ama o suficiente durante todo o ano, não precisamos de uma data específica para lembrarmos disso.

E no dia 25, todos comeram arroz, feijão, ovo, e um resto de pão que o diabo amassou.

11 de novembro de 2017

quinta-feira, 21 de dezembro de 2017

PEC 181

Carlos Mason é um homem branco, pai de família, trabalhador, religioso, honesto e pagador de impostos. Ocorre que Carlos Mason possui um único problema. Carlos Mason só consegue ter ereção por meio da violência física. É um fator até frequente na população masculina, fruto de uma criação desestruturada, com pai agressivo e opressor. Carlos desenvolveu-se com a libido diretamente ligada ao espírito opressor. E opressor se tornou.

Sua esposa, Amalgajiza, teve dois filhos, Arthur e Mariana. Ambos frutos de relações forçadas, pois Amalgajiza não queria ter filhos e, impossibilitada de usar pílulas (é contra Deus, dizia o marido) e preservativo (eu não vou fuder mulher minha com plástico cobrindo meu pau, segundo o mesmo), nunca conseguiu se utilizar de métodos contraceptivos.

Após a segunda gestação, Amalgajiza passou a rejeitar Carlos Mason na hora do sexo. Isso causou um certo furor na cabeça do Carlinhos, nosso amigo.

Sem ter o que "comer" em casa, Carlinhos fez o que deve fazer todo homem de verdade, ciente da sua masculinidade e que não se apequena frente a negativa daquela que deveria prover os seus desejos básicos: Carlinhos traiu.

Beijo daqui, beijo de lá, Madalena foi tentando se desvencilhar de Carlinhos, que partiu pra cima sem perdão. Mais fraca, Madalena não teve reação após o soco desferido pelo machão Carlinhos. Deu. Carlinhos gozou, limpou na toalha da mesa da casa de Madalena e foi-se.

O tempo passou. Madalena foi se embuchando. Tensão no ar.

Perto dos nove meses, dores, o diabo durante a gravidez que não pôde ser interrompida graças à bondade e sapiência dos senhores representantes do povo que aprovaram a PEC 181, Madalena se viu na iminência de dar à luz o fruto de um estupro perpetrado por Carlinhos, nosso brother.

Madalena mandou avisar Carlinhos.

Irritado, esbravejando, puto da vida, Carlinhos mandou tomar no cu todos os 18 que, inicialmente, posicionaram-se a favor da PEC que o fazia, agora, responsável por uma criança não querida. Carlinhos, nosso amigão, agora seria forçado a ser pai de uma criança que ele não programou, fruto de uma foda que ele só teve por prazer, por vingança de Amalgajiza.

Carlinhos xingou muito no Twitter. Carlinhos foi à mídia. A mídia recebeu Carlinhos, como não recebeu nenhuma mulher quando a proposta passou por uma comissão e vários protestos foram realizados.

Carlinhos mexeu com o brio dos eméritos deputados e nobres senadores que se compadeceram com a sua dor.

A PEC 181 foi revertida.

E tudo voltou como antes era.

Os estupradores nunca mais foram forçados a ser pais e dividir seu patrimônio com um bastardozinho qualquer, que deveria ser apenas porra perdida.

O povo de bem, mais uma vez, vencia o mal.

29 de novembro de 2017

segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

Cansaço

E aí eu nem mais me importava com nada.
Eu nem me ligava a nenhuma coisa,
eu nem queria saber de outras pessoas.

A vida era o que deveria ser
e eu deixava que fosse o que seria.

E tudo era o que era mesmo.
E todo sabor era o mesmo sabor.
E toda diversão era a mesma diversão.
E tudo era o tudo do mesmo.

Cansei!

Cansei de ter que explicar
e eu explico o que tudo é
do jeito que é.
Do jeito que tudo diz
que deve ser o que tudo é.

E eu canso de ser o que eu sou
porque o manual do que diz o que sou
diz que eu devo ser como eu sou
exatamente assim, como sou.

Canso. Canso de cansar. Tédio.
Entedio-me de me cansar.
Entedio-me de me entediar de cansar do tédio.

Desliguem a TV!
Desliguem o celular!
Desliguem tudo!

É tudo tanta coisa cheias de coisas.
Tantas coisas coisas cheias de tudo.
E cansa-se.
Em algum ponto esgota-se.
Não quando somos jovens.
Não quando achamos não ser.
Só depois.
Só quando é tarde demais.

11 de novembro de 2017

quinta-feira, 14 de dezembro de 2017

Social real

Não é "você é feliz?", não.
A pergunta certa é "você ESTÁ feliz?".
A felicidade é ali. Específica.
Está, nunca é.
Ser é demais para sentimentos.
Ser é humano. Humano é, e sempre está coisa ou outra,
outra ou coisa.
Busca a harmonia e nunca encontra,
vive e morre na corda bamba.
Atua e se deixa levar,
permite-se ser sem ser de fato.
E fingimos todos.

Filho da puta do Fernando Pessoa,
aquele cretino que decretou que apenas o poeta
era um fingidor e fingia tão completamente
que fingia ser dor a dor que realmente sentia.
Todos somos, de fato, poetas,
todos somos, em verdade, fingidores.
E fingimos.
E enganamos.
E nos dizemos bem.
E nos falseamos felizes.
Só para parecermos reais
na irrealidade das redes sociais.

E no fim acabamos por nos esquecer que a vida real
é toda uma real rede social.
Mas nela ninguém consegue fingir.

11 de novembro de 2017

segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

Esquinas

Tanto por perder, tanto por viver.
A vida por um fio.
De um lado a vontade de seguir.
De outro a desesperança de não conseguir.

Seguir a vida, deixar tudo pra trás,
tentar seguir em frente, sem arrependimento.
Poder viver o sonho por um momento.

E ela só queria ser amada.
Mas amor falta na terra da cobrança,
querem-na demais, exigem suas forças,
cobram mais e mais, esgotam a moça.

O porto seguro de outrora
é lembrança longínqua na memória.

O amor ela guarda em si, sente em si.
Mas queria viver esse amor, vivenciar esse amor,
sentir na pele, nos pelos arrepiados do toque,
no coração pulsando do carinho,
na paz calmante do ninho.

E mesmo próximo tudo é distante.
E mesmo ali, nada está.
E mesmo que busque, foge.

Resta a solidão de estar apenas.
Resta o deseja de não ser apenas.
Resta a vontade de se libertar
deixar-se viver sem culpas
e poder sorrir enfim, sem falsa modéstia,
a plenos pulmões,
a felicidade que nunca a encontra.

Quantas esquinas ainda há de dobrar
até tropeçar na vida que merece ter?

11 de novembro de 2017

quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

Titãnicos

Já cantaram que a gente não queria só comida,
e a gente ainda quer bebida, diversão e arte.
Cantaram que a gente não queria só comida
mas também saída para qualquer parte.
A gente continua não querendo só comer,
mas também beber e fazer amor.
A gente ainda quer comer
e quer ter prazer pra aliviar a dor.

Mas a cesta é básica e nem dá pro básico,
o salário pra render só se a gente for mágico.
A diversão é cara e censuram a arte,
O rolêzinho é boicotado quase em toda parte.

A comida não pode ser só o pasto, ou a ração.
A bebida até pode ser só a água, mas um suco é bom.

E a gente ainda não quer só dinheiro,
mas ainda sonha com a felicidade.
A gente sabe não terá o inteiro,
nem sequer metade,
pois saibam que no sonho primeiro
a gente quer apenas oportunidade.

A gente só quer o que a gente precisa
nada mais queremos não.
A gente só quer o que a gente precisa
e o que a gente precisa é educação.

A gente só quer o que você quer.
A gente só quer ser feliz,
assim como você,
do jeito que der.

08 de novembro de 2017

segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

Discurso político

É preciso reconhecer os nossos defeitos,
aliás, é deles que advém boa parte da nossa personalidade,
eles são o que somos.

As virtudes figuram no campo do dever-ser.
Já os defeitos desfilam na avenida do ser.
Virtudes são ficção.
Defeitos são realidade, pura e comprovada,
mesmo que com gosto amargo.

É preciso conhecer os nossos defeitos,
pois não há tratados sobre eles.
Destinar um tempo a distingui-los,
separadamente,
para dar-mo-nos conta de quando estamos sobre seus efeitos.

Defeitos, eis do que somos realmente feitos!
Afinal, virtudes e qualidades são meros acessórios
que usamos para enfeitar nosso currículo.

08 de novembro de 2017