quinta-feira, 20 de abril de 2017

Sobre caciques, ovelhas, nós e eles



Temer é golpista!
Lula é ladrão!
Aécio safado!
Moro herói!
Bolsonaro mito!

Eis os gritos de guerra das torcidas organizadas pelo país.

O Brasil hoje é um país que não sabe conviver com opiniões divergentes. Penso até que nunca soube. Mas os tempos de hoje nos permitem colocar os nossos demônios expostos ao sol.

Todo mundo quer provar (impor) seu ponto de vista, ao invés de abrir espaço para o diálogo. E, note, o ponto de vista que se quer impor raramente é o próprio ponto de vista, mas, sim, o de alguém que se idolatra e se adota como “salvador da pátria”. É assim, como sempre foi em nossa história.

Dizem que o brasileiro é um povo pacífico. Equívoco! Não guerreamos por aí por falta de oportunidade (e material). Mas, internamente, matamo-nos, sufocamo-nos e vamos vivendo, fingindo que tudo é lindo, que somos abençoados por deus, etc etc etc. E aí vem o carnaval. O brasileiro é um povo passivo. Sim, passivo. Ficamos esperando a mágica cair do céu. Esperamos o salvador da pátria. Votamos e deixamos o problema os eleitos, sem nos darmos conta que o problema é de todos nós.

Dessa forma, fomos criando caciques, políticos profissionais que de quatro em quatro anos se nos mostram como salvadores da pátria e vão se perpetuando no poder, enchendo seus bolsos, enquanto daqui de baixo, assistimos silenciosamente o caos se instaurando. De vez em quando lembramos de reclamar, botamos fogo nuns pneus aqui, fazemos uma passeata com camisa de Confederação corrupta ali, colocamos a culpa no outro, no que votou no partido X, e não no nosso partido Y. E vamos nos digladiando para o deleite daqueles que, do alto, aguardam o quadriênio para reaparecer com as mágicas salvadoras.

Dessa forma, vamos vendo o patrimônio público ser dilapidado, pouco a pouco, às vezes nem tão pouco a pouco assim. Achamos que só roubam os políticos que desviam verba pública e não nos damos conta que o ônibus depredado, as carteiras da escola quebradas e pichadas, os fios de cobre da iluminação pública furtados, tudo isso é também um roubo contra o patrimônio público, justamente por ser, tudo isso, PÚBLICO!

Com a nossa passividade, deixamos à míngua a noção do que é público, e quem bem sabe distinguir o público do privado, aqueles mesmos caciques que deixamos como salvadores da pátria, aos poucos vão fazendo do primeiro o segundo e se apoderando de tudo.

E então vêm à tona os grandes escândalos de corrupção. Milhões, bilhões desviados de forma fraudulenta a encher os bolsos, cuecas, mochilas, cofres e contas no exterior daqueles que deveriam estar legislando e trabalhando em prol da sociedade. Mas, como a sociedade não está nem aí, vão ajeitando as coisas para si e para os seus próximos.

Muitas vezes esses próximos são os primeiros a sair em defesa dos “atacados pela mídia” e esbravejam contra todos os que falam mal dos seus queridos caciques. Vai se criando a lógica do “nós x eles”, onde nós, somente nós, somos os detentores das verdades universais e eles são meros ignorantes, que deveriam ser calados. E ainda continuamos, “nós”, a sermos os defensores da democracia, dos direitos humanos, etc etc etc, tudo, é claro, de forma relativizada. Direitos pra todos, mas, não igualmente.

No atual cenário é nítida essa lógica do “nós x eles”, consistindo em vagas alegações que tentam demonstrar que “nós” somos menos bandidos que “eles”, sem que ninguém, de forma alguma, assuma seus erros. Sem que se possa, de alguma forma, vislumbrar a abertura da uma janela para o diálogo.

E vamos tocando em frente, até que todos possam ter armas em punho e o direito de atirar em quem nos contraria.

O futuro é logo ali.

18 de abril de 2017.

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