segunda-feira, 30 de abril de 2018

Sentença

Sua irmã apresentou a filha recém-nascida, toda enrolada em sua roupinha com aquele cheiro acolhedor que só os bebês possuem e que se perde com o tempo. As mãozinhas enrugadas seguraram o seu dedo, ela olhou fixamente para os olhinhos que custavam abrir e sentenciou:

- Ela vai morrer.

A irmã subitamente puxou para si o pacote de vida fresca e abraçou-o forte, o tempo fechou, nuvens carregadas cobriram o sol que brilhava há instantes, o cunhado partiu para cima da jovem "O que você disse?", "Você está louca?" vociferou a mãe de primeira viagem.

- Todos vamos morrer, disse.

Os olhos enraivecidos viraram mãos pesadas a empurrar para fora da sala a jovem tia, "Saia já sua maluca!", "Vamos, fora!", e outros tantos gritos seguidos de xingamentos.

Eis que a maior obviedade, o fato mais absurda e repetidamente comprovado na história da humanidade havia sido rechaçado por quem estava distante da realidade.

Ela saiu a caminhar pela rua, ouvindo um rock antigo, enquanto as primeiras gotas caiam sobre todos. Como a morte um dia cairá.


23 de abril de 2018

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