quinta-feira, 23 de março de 2017

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É tarde. Tanto na vida, quanto no dia.
Na vida, dizem-me que não, mal iniciados os trinta.
No dia, o sol já se prepara a voltar depois de ir há tanto.
Leio Pessoa em nome de Bernardo Soares,
e os seus ditos, perdidos na loucura de dias passados,
soam-me como a minha'lma
decantando lamentos a quem sou ou fui.
Como Soares, sinto saudades de quem poderia ser.
E nunca pude conhecê-lo, como jamais poderei,
pois o tempo que me resta não sei,
o que tempo que me foi, passou.
Sou um lamento de pernas bambas,
sentadas sobre joelhos doloridos
que não suportam mais caminhar.
O horizonte fica-me além dos olhos cansados.
Os sonhos no pouco sono
entre pesadelos
e falta de ar.
A vida corre-me lenta,
queria morrer.
Passam dias e noites
e, sem que note, e noto além do que posso,
não sei que dias passam, que dias são.
Perdi-me no tempo de minha vida,
sem saber o que era pra ser vivido outrora,
sem saber viver o que não vivi,
sem saber sonhar o que queria ser.
Fui sem notar-me ser.
Vivi sem sentir o ar enchendo-me, verdadeiramente,
os pulmões meus.
Respeirei o gás carbônicos de outros pulmões,
vi a vida através de outros olhos,
e de respirar tanto carbono,
de enxergar tanta estrada que não a minha,
quando vi-me de volta ao meu mal-fadado corpo,
minha'lma notou-se cansada,
e há meses tenta se apoiar nas falsas promessas
e velhos conselhos embolorados
no afã de tentar seguir.
Mas doem-me também os joelhos d'alma.
Doem-me os pulmões de não ter vivido.
Dói-me o fato de não ter sido.
O sol lá fora fere os olhos.
Ressinto-me de sair,
apesar de saber preciso.
Eu só queria voltar pra casa.

26 de fevereiro de 2015

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